A polêmica de 'You': por quê psicopatas da ficção são adorados pelo público?
Quando parte do público que assistiu a série Você, disponível na Netflix desde o final do ano passado, se declarou apaixonada pelo protagonista Joe em postagens nas redes sociais, o ator Penn Badgley, responsável por interpretar o personagem, se mostrou incomodado.
Receba no seu Whatsapp as novidades sobre o mundo dos famosos (e muito mais)
Uma usuária do Twitter o marcou numa publicação pedindo para que ele também a sequestrasse. Outra disse que Joe é muito sexy. Já outra, foi na direção oposta, escrevendo: “A quantidade de pessoas romantizando o personagem de Penn Badgley em Você me assusta”. O ator concordou. “Sinto o mesmo. Essa é toda a motivação que preciso para a segunda temporada.”
O seriado da Netflix conta a história de um dono de livraria que se interessa por uma cliente de sua loja. Para estar com ela, ele a persegue nas redes sociais para saber detalhes sobre sua vida, a isola dos amigos e chega até mesmo a cometer assassinatos. A série está, portanto, bem longe de ser uma série de amor, ainda que algumas pessoas vejam um fundo romântico nas ações de Joe. Está mais para psicopatia.
“O que caracteriza um psicopata é a manipulação das circunstâncias e das pessoas; a ausência do sentimento de piedade, compaixão e altruísmo; além da falta de vínculos profundos com as pessoas”, define em entrevista ao Yahoo! o psiquiatra forense Guido Palomba, que há mais de quarenta anos estuda o comportamento e a mente de responsáveis por crimes violentos.
Ao analisar o comportamento de Joe durante a série, dá para dizer que ele fica no meio do caminho entre esta descrição de psicopatia e aquilo que Palomba chama de “condutopata”, quando a anormalidade, está na conduta do indivíduo. “São indivíduos que têm uma conduta patológica, doentia”, diz, salientando que, ao contrário dos psicopatas, os condutopatas possuem a capacidade de sentir emoções.
Em comum nos dois casos, há o fator da manipulação, o que faz com que estas figuras sejam interessantes de se acompanhar, desde que à distância segura, na tela da TV ou do computador. “A maioria absoluta é manipuladora. Isso explica porque eles levam muitas pessoas na conversa. Se for uma pessoa bonita e manipuladora, ela pode fazer miséria”. As admiradoras virtuais de Joe comprovam isso.
Realidade vs. ficção
‘You’ está longe de ser a primeira série estrelada por um indivíduo com traços de psicopatia. Alguns outros exemplos recentes são Dexter e Bates Motel, cujos protagonistas também conquistaram o coração do público, apesar de ações moralmente condenáveis. “Psicopatas são mais glamourosos e atraentes na ficção do que na realidade”, alerta Palomba, que costuma participar de programas como Anatomia do Crime, do Canal Discovery, no qual analisa casos verídicos conhecidos, como a morte da menina Isabella Nardoni.
Leia mais: Sarah Paulson: ‘ambiente político tóxico é o verdadeiro terror contemporâneo’
“Na realidade eles não são pessoas fáceis de lidar, não têm amigos. Você pega o histórico de qualquer psicopata da realidade e vê que eles não tinham vínculo nenhum com nada, com coisa nenhuma”, afirma.
Para o especialista, outra diferença fundamental entre ficção e a realidade está no fato das séries criadas por roteiristas sempre buscarem uma justificativa para o comportamento daqueles personagens. O próprio Joe, de ‘Você’, quando confrontado com seus atos argumenta ter sofrido um trauma quando criança.
“É algo com o qual o indivíduo nasce, cresce e morre. Não é influência do meio, nem de vivência dolorosa. Essa coisa que os norte-americanos dizem que uma situação de abuso gera um psicopata é mentira, é conversa para boi dormir”, considera Palomba. “Quer dizer que todas as pessoas bolinadas na infância são psicopatas? Óbvio que não”.
Uma coisa é certa: tramas como a de ‘You’ costumam gerar muito audiência e comentários. Ciente disso, a Netflix já prepara a estreia de outra série sobre um caso de amor doentio, ‘Dirty John’, que chega à plataforma em 14 de fevereiro.
Assista a seguir: O que ver na Netflix em janeiro?