'Led Zeppelin IV', disco de 'Stairway to Heaven', faz 50 anos e ainda impressiona
SĂO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um dos ĂĄlbuns mais amados da histĂłria, definidor do hard rock dos anos 1970, "Led Zeppelin IV" faz 50 anos nesta segunda-feira. Ă o disco que traz a canção "Stairway to Heaven", um Ăcone do gĂȘnero, e que transformou os quatro integrantes do Led Zeppelin em estrelas mundiais, cultuados atĂ© hoje.
Como acontece com praticamente toda grande obra, a produção de "IV" teve percalços, dĂșvidas e surpresas. RespeitadĂssima, a banda havia estreado com dois bons discos de rock em 1969, mas o terceiro, de 1970, havia sido mal recebido pela crĂtica -embora nĂŁo pelo pĂșblico.
De "Led Zepellin III" foi escrito, por exemplo, que as cançÔes pesadas eram muito cruas e parecidas entre si. E que o material folk não passava de imitação de Crosby, Stills, Nash & Young.
Assim que "III" saiu, Jimmy Page e Robert Plant começaram a compor novas mĂșsicas. Incomodada com as crĂticas, a banda desistiu de sair em turnĂȘ para promover o novo disco e se isolou numa casa de campo no sul da Inglaterra. Ali, entre jams e reuniĂ”es em frente Ă lareira, os quatro passaram o inverno, compuseram e gravaram as oito cançÔes de "IV" entre dezembro de 1970 e fevereiro de 1971, com produção de Page.
O equipamento usado foi o famoso estĂșdio mĂłvel dos Rolling Stones, montado na caçamba de um caminhĂŁo e que era alugado para outros artistas quando Jagger e Richards nĂŁo estavam gravando.
Uma primeira mixagem foi descartada, e a segunda, feita em julho de 1971, deu certo. Talvez para responder Ă s crĂticas sobre o anterior, Page enfiou na cabeça que o novo ĂĄlbum nĂŁo teria tĂtulo e que o nome Led Zeppelin nem sequer estaria escrito na capa.
Em vez disso, cada membro do grupo criaria ou escolheria um sĂmbolo. O de Page, que parece ter a palavra ZoSo estilizada sobrevive atĂ© hoje nas camisetas pretas envergadas pelos fĂŁs. Para a imagem da capa, escolheram um quadro antigo que Plant havia comprado numa loja.
O tĂtulo pelo qual o disco Ă© conhecido, afinal, nĂŁo Ă© de verdade. Ă um apelido que segue lĂłgica dos ĂĄlbuns anteriores, que simplesmente traziam o nome da banda e nĂșmeros romanos. A gravadora tentou de todo jeito demover a ideia de lançar a obra sem o nome da banda estampado, mas Page segurou as fitas e sĂł as entregou quando a Atlantic Records aceitou fazer como ele queria.
"Black Dog" abre o disco com potĂȘncia, no estilo cantor gritando uma frase e guitarra respondendo com outra. O riff, complexo e com mudanças de tempo, foi escrito pelo baixista John Paul Jones. O cachorro preto do tĂtulo se refere a um cĂŁo que rondava a propriedade onde a banda estava. Mas a letra de Plant pouco se refere a ele, preferindo desfilar lamentos sobre sexo e mulheres.
O mesmo se pode dizer sobre "Rock and Roll", que traz um riff clĂĄssico do gĂȘnero, inspirado em Chuck Berry. JĂĄ a empolgante bateria de John Bonham, que abre a mĂșsica, Ă© quase um decalque de "Keep A-Knockin'", de Little Richard.
Ian Stewart, o "sexto stone", que tocou piano em diversos clĂĄssicos dessa banda, estava "alugado" junto com o estĂșdio mĂłvel e participa castigando as teclas em "Rock and Roll".
Uma segunda participação especial Ă© a da cantora Sandy Dennis, da banda folk Fairport Convention. Ela e Plant fazem um dueto na delicada "The Battle of Evermore", inspirada num livro sobre as guerras de independĂȘncia escocesa do sĂ©culo 14 que Plant estava lendo.
"Black Dog" e "Rock and Roll" saĂram em compactos na ocasiĂŁo, mas o que a Atlantic Records queria mesmo para o single era "Stairway to Heaven", a quarta canção do disco, que fecha o lado A.
Robert Plant, Jimmy Page, John Paul Jones e John Bonham nos anos 1970 Divulgação **** Plant depois contou em entrevistas que a banda nĂŁo aceitou por duas razĂ”es. Primeiro porque queriam que a canção fosse ouvida no contexto do ĂĄlbum. Segundo porque se os Ă©picos oito minutos e dois segundos saĂssem em compacto, provavelmente com metade de cada lado, o prĂłximo passo seria uma versĂŁo condensada para facilitar que tocasse nas rĂĄdios.
Essa possibilidade horrorizava, com razĂŁo, a dupla. "Stairway to Heaven" Ă© uma canção construĂda em trĂȘs partes distintas, que nĂŁo se repetem como numa mĂșsica normal. Aqui, o primeiro movimento evolui para o segundo e depois ao terceiro, cada qual mais rĂĄpido, mais barulhento e mais empolgante que o anterior. Mexer nessa arquitetura seria um desastre anunciado.
Impressionados com as palavras que Plant escreveu -que nĂŁo traz uma histĂłria, mas um mosaico de observaçÔes sobre a vida-, pela primeira vez o Led imprimiu a letra de uma mĂșsica, no encarte de papel interno. "Desta vez, tĂnhamos o que dizer", disse Plant em uma famosa declaração. "Quando li as duas primeiras linhas que havia escrito, quase caĂ da cadeira", disse o cantor.
Segundo um biĂłgrafo da banda, "Stairway to Heaven" foi a mĂșsica mais pedida nas rĂĄdios americanas durante a dĂ©cada de 1970. A parte inicial da canção foi inspirada em "Taurus", faixa de 1968, da banda americana Spirit, com quem o Led Zeppelin excursionou nos anos 1960. Em 2016, uma ação contra os ingleses chegou a uma corte nos Estados Unidos, mas nĂŁo teve sucesso.
O lado B de "Led Zeppelin IV" nĂŁo acompanha a excelĂȘncia do lado A. "Misty Mountain Hop" Ă© uma canção esquisita e sem direção, enquanto "Four Sticks" nĂŁo passa de um rock ordinĂĄrio. "Going to California", no entanto, Ă© uma das mais belas baladas que o Led Zeppelin jĂĄ gravou. Inspirada por Joni Mitchell, de quem Plant era fĂŁ, traz um dedilhado envolvente e ensolarado.
O disco fecha com um cover de 1929, "When the Levee Breaks", de Memphis Minnie e Kansas Joe McCoy, que fala de uma enchente do estado americano do Mississippi em 1927. A banda retrabalhou a mĂșsica -e teve a pachorra de assinar a composição ao lados dos veteranos. Ă um rock demolidor, com uma gaita assassina e maravilhosa, tocada por Plant, e que encerra de forma valente esse ĂĄlbum tĂŁo especial.
"Led Zeppelin IV" vendeu 37 milhÔes de cópias no mundo desde 1971 e provavelmente vai continuar sendo ouvido pelos próximos 50 anos. Nada mal para um enorme zepelim que parecia ser mais pesado que o ar.