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SĂO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ano passado foi diferente para o Pearl Jam, mas nĂŁo sĂł para a banda. Enquanto o grupo lançava seu primeiro disco de inĂ©ditas em sete anos, "Gigaton", no meio de março, uma pandemia tomava conta do planeta. "A gente estava ensaiando para entrar em turnĂȘ -atĂ© termos que cancelar", diz Stone Gossard, guitarrista do grupo. "Acho que nenhum de nĂłs estava esperando isso. Tinha muita coisa envolvida naquela turnĂȘ." Acostumado a passar meses a fio na estrada, o Pearl Jam teve que se contentar em acompanhar a recepção do ĂĄlbum -no qual trabalhavam hĂĄ seis anos- de casa. "Li apenas algumas resenhas, mas acho que Ă© um dos nossos melhores discos. Amo a variedade dele. E os vocais de Eddie estĂŁo estupendos." "Gigaton" Ă© de fato mais variado e vai desde o som enĂ©rgico e pesado -marca da banda e da Seattle dos anos 1990- atĂ© as baladas e faixas atmosfĂ©ricas puxadas pelo vocalista, Eddie Vedder. "Ainda vamos conseguir tocĂĄ-lo. Estamos mais velhos e, portanto, mais pacientes agora." De fato, hoje o Pearl Jam Ă© uma das grandes bandas de rock do mundo mais experientes em atividade. O grupo despontou em 1991, com o disco de estreia, "Ten", em meio Ă onda grunge que explodiu em sua cidade natal, com o sucesso de Nirvana, Alice in Chains e Soundgarden, entre outros. Gossard diz que o mais difĂcil, depois de tantos anos tocando juntos, Ă© se manter criativo. O processo de composição, ele diz, Ă© coletivo, com todos os integrantes sugerindo arranjos. Mas a palavra final Ă© do vocalista. "O difĂcil Ă© escolher o que fica no fim", diz. "Eddie se apaixona por nossas ideias. Ele pega alguns arranjos, e tambĂ©m faz outros. Acho que ele faz isso muito bem. E deixou algo especial de cada um no produto final." Sendo uma banda consagrada e com bagagem, ele diz, fica fĂĄcil relaxar e fazer um disco mais contemplativo. Mas, apesar dos momentos menos intensos, "Gigaton" Ă© um disco que preserva o alto nĂvel de energia do grupo -conhecido especialmente dos shows que, via de regra, podem chegar ou passar das trĂȘs horas de duração. "VocĂȘ fica em casa, com sua famĂlia, cuidando dos filhos, entĂŁo Ă© fĂĄcil fazer mĂșsicas mais calmas. Precisamos estar no mesmo cĂŽmodo para conseguir deixar mais animado. Mas Ă© algo que fazemos desde o começo, equalizar o barulho e as partes mais suaves nas mĂșsicas." Gossard, hoje com 54 anos, aproveita o perĂodo em casa esperando uma vacina, cozinhando, lavando louça e cuidando dos quatro filhos. NĂŁo Ă© exatamente o estilo de vida roqueiro e questionador de padrĂ”es com o qual ele fez fama, e hoje ele diz aprender com a juventude. "O cĂ©rebro de todo mundo estava ligado em como Trump lidava com a presidĂȘncia, com a imprensa. Tivemos a sensação de que aquilo estava fora de controle. Como alguĂ©m pode ser tĂŁo parcial, pensar sĂł de um jeito, servir sĂł a si mesmo? Foi um choque. Todas essas revoluçÔes que estĂŁo acontecendo, como Black Lives Matter, tĂȘm muito a nos ensinar." Gossard diz que o ano atĂpico de 2020 deve servir para reflexĂ”es. "NĂŁo estamos prestando atenção nas realidades de algumas pessoas em nosso paĂs e no mundo. Ă uma Ă©poca para ouvirmos o quanto pudermos sobre as experiĂȘncias de outras pessoas." "Gigaton" Ă© o primeiro -e Ășnico- disco da banda lançado durante a era Trump, a quem eles se opuseram com veemĂȘncia, inclusive apoiando o democrata Joe Biden na Ășltima eleição. A mĂșsica "Quick Escape", um hard rock que fala de um apocalipse ambiental, traz Eddie Vedder cantando sobre "um lugar que Trump ainda nĂŁo tenha destruĂdo". "Nos Ășltimos anos, todo mundo achava que o que eles nunca imaginaram que poderia acontecer estava acontecendo --e nĂŁo para de acontecer. Parece que estamos num filme." No ano atĂpico de Gossard, ainda houve tempo para o lançamento de um projeto paralelo, o primeiro disco, homĂŽnimo, da banda Painted Shields. Ele toca guitarra no ĂĄlbum, que tem tambĂ©m o primeiro baterista do Pearl Jam, Matt Chamberlain, e a tecladista Brittany Davis. O disco, feito entre idas e vindas durante cerca de seis anos, surgiu de uma parceria entre Gossard e o cantor e compositor com pegada folk Mason Jennings. Para o lançamento, o guitarrista reativou o selo Loosegroove Records, que ele tinha nos 1990 e foi casa do primeiro ĂĄlbum do Queens of the Stone Age. Mas a gravadora jĂĄ prepara o lançamento de uma pĂ©rola inĂ©dita do rock americano para este ano. Trata-se do nunca ouvido disco do grupo The Living, gravado em 1982, e que tinha o futuro baixista do Guns N' Roses, Duff McKagan, e Greg Gilmore, que tocou na banda Mother Love Bone (uma das pioneiras na cena que viria a gerar o grunge). "Eles tinham uns 17 anos de idade. Duff compĂŽs todas as mĂșsicas. VocĂȘ ouve nos riffs elementos do Guns, da [banda punk seminal de Seattle] Green River, de todas as bandas que vieram depois. Vai ser uma viagem para as pessoas ouvirem aquilo e perceberem como a composição do Duff era impactante jĂĄ naquela Ă©poca, antes de ele deixar Seattle para começar o Guns N' Roses."