Vanessa Lopes e influenciadores ganham mais do que outros profissionais?
Na minha primeira semana de aula na universidade, hĂĄ quase 10 anos (o tempo voa mesmo!), um professor perguntou qual era a ĂĄrea do jornalismo em que pretendĂamos trabalhar. Alguns responderam rĂĄdio e televisĂŁo, outros disseram jornais e revistas e, acredite, praticamente ninguĂ©m levantou a mĂŁo quando esse mesmo professor questionou se gostarĂamos de ser influenciadores.
Nem preciso dizer que, atualmente, qualquer curso de comunicação â e atĂ© de outras ĂĄreas â reflete uma realidade bem diferente. O crescimento da internet e das redes sociais, principalmente do Instagram, mudou nosso jeito de produzir e consumir informação e entretenimento. E basta dar uma rĂĄpida olhada no TikTok para ver que mĂ©dicos, advogados e outros profissionais â formados ou nĂŁo â encontraram on-line uma nova forma de compartilhar conhecimento, divulgar trabalhos e, consequentemente, fazer dinheiro.
Não são todos que conseguem tantos contratos a ponto de ganhar mensalmente mais do que um médico ou um advogado
Mesmo assim muitos ainda mantĂȘm um certo ar de desconfiança (ou demĂ©rito?) em relação aos criadores de conteĂșdo digital. Quando, hĂĄ cerca de um mĂȘs, Bianca Andrade deixou Ă mostra um cronograma de produção de stories, vĂĄrios internautas ficaram surpresos e o "flagra" rapidamente viralizou. Quem diria que ser um(a) influencer Ă© mais complexo do que apenas pegar o celular e postar aleatoriamente, afinal?
"Nós também pensamos, somos um negócio inteligente. E nenhum negócio se mantém em longo prazo sem estratégia. Então, é importante ter esse diålogo, mostrar o que acontece do outro lado, porque as coisas se confundem, né? Por eu dividir muito a minha vida pessoal, pode parecer que tudo que faço é maquiavélico, que sou um robÎ, e não é assim. Ali é o meu trabalho", comentou ela durante uma palestra sobre marketing.
A discussĂŁo mal esfriou e algo muito parecido aconteceu com Vanessa Lopes, uma das maiores tiktokers do Brasil, quando ela revelou suas metas diĂĄrias de postagem durante uma entrevista. Rapidamente teve gente que sentiu que se esforça mais e ganha menos â dinheiro e reconhecimento â do que ela. "Essa reação Ă© natural se pensarmos que vĂĄrias pessoas ainda acham que trabalhar na internet Ă© sĂł fazer 'dancinhas', receber produtos e viajar de graça. Fora que elas exigem naturalidade, verdade, e isso pode passar a impressĂŁo de que Ă© tudo sempre calculado", avalia Priscila JaffĂ©, empresĂĄria e CEO da JaffĂ© Agenciamento e Marketing de ConteĂșdo.
"As pessoas nĂŁo imaginam, mas cronogramas e metas ajudam muito a manter a organização e a frequĂȘncia. E, sem frequĂȘncia, as redes sociais nĂŁo entregam o conteĂșdo para os usuĂĄrios e os nĂșmeros caem. O ritmo Ă© intenso e exige bastante tempo e dedicação, jĂĄ que a qualidade tambĂ©m Ă© uma preocupação. Um vĂdeo de um minuto pode levar horas para ficar pronto", completa.
Priscila aproveita para ressaltar que, por trĂĄs de um grande um influencer, hĂĄ sempre muitos profissionais (formados, inclusive). SĂŁo cabeleireiros, maquiadores, figurinistas, videomakers, assessores, entre outros que recebem parte do que Ă© pago pelas famigeradas "publis". "Tem tambĂ©m a questĂŁo dos impostos e da comissĂŁo das agĂȘncias. EntĂŁo, por maior que seja o cachĂȘ, Ă© ilusĂŁo acreditar que tudo vai para o criador de conteĂșdo. AliĂĄs, nĂŁo sĂŁo todos que conseguem tantos contratos a ponto de ganhar mensalmente mais do que um mĂ©dico ou um advogado", pontua.
Os influencers menores, por outro lado, executam mais de um papel e frequentemente estĂŁo Ă frente dos roteiros, da produção, da edição e atĂ© das funçÔes mais burocrĂĄticas da empresa â sim, cada um deles representa uma empresa e tudo que isso implica. "Assim como ocorre ou deveria ocorrer em todas as ĂĄreas, o criador estipula valores de acordo com o que investiu para se especializar nessas tarefas ou na contratação de sua equipe e, claro, com o que ele ou ela entrega em termos de credibilidade, alcance e engajamento", diz Thays Almendra, fundadora e CEO da Digital Social BR.
Com quase 2,5 milhĂ”es de seguidores no Instagram e no TikTok, Jessica Sabbag nĂŁo tem exatamente um cronograma, mas estabeleceu um limite diĂĄrio (dois) para posts publicitĂĄrios. "Assim, garanto o equilĂbrio entre o orgĂąnico e as entregas de um jeito bom para o pĂșblico. Por mais que eu selecione bem os trabalhos, nĂŁo faça nada que nĂŁo tem a ver comigo e com o que eu gosto, sei que quem me acompanha quer ver meu dia a dia, vĂdeos de humor, receitas", conta a influencer.
A relação prĂłxima e o retorno imediato da audiĂȘncia, vale lembrar, Ă© outro diferencial da profissĂŁo e tem seu preço. "Expor a vida para tanta gente requer uma saĂșde mental muito boa. Sempre tem alguĂ©m te criticando, tentando te atingir e lidar com isso nĂŁo Ă© nada fĂĄcil. Diria tambĂ©m que, mais do que conseguir seguidores, o desafio Ă© fidelizĂĄ-los e nĂŁo perder a sua essĂȘncia, uma vez que todos os dias surgem criadores de conteĂșdo diferentes ou que começam a se destacar, seja qual for o nicho", reflete Jessica Sabbag.