'Continuo sendo musa', diz Giovanna Gold, a Zefa de 'Pantanal' de 1990
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Ela foi a primeira Zefa de "Pantanal", hĂĄ 32 anos. EntĂŁo estreante na TV, Giovanna Gold, 58, causou estardalhaço mesmo em um papel secundĂĄrio - Ă Ă©poca, ela era a mulher contratada por Maria Bruaca (Ăngela Leal) para ajudĂĄ-la na cozinha e nos afazeres domĂ©sticos.
Giovanna estampou capas de revista, virou musa nacional, era parada nas ruas. Tudo coerente com o sucesso da novela exibida pela extinta TV Manchete, a primeira a bater a Globo em audiĂȘncia. Um assombro. Um feito e tanto, lembrado com carinho pela atriz que, apesar das boas recordaçÔes, se recusa a fazer comentĂĄrios sobre a trama atual.
"NĂŁo recebo nada da Globo para falar da novela. NĂŁo sou comentarista paga para analisar a obra. O que eu tenho Ă© um compromisso amoroso com a minha experiĂȘncia", diz a atriz, que recentemente lançou um aplicativo criado para ajudar artistas a memorizar e interpretar textos. Moradora do Vidigal, comunidade da Zona Sul do Rio, ela assume ter medo de viver ali, apesar da vista embasbacante das praias do Leblon e de SĂŁo Conrado. Giovanna concedeu a seguinte entrevista Ă Folha de S.Paulo:
PERGUNTA - O remake de "Pantanal" vem batendo recordes de audiĂȘncia na Globo. Como intĂ©rprete da Zefa na primeira versĂŁo, em algum momento sentiu ciĂșme da personagem?
GIOVANNA-GOLD - NĂŁo chamo de ciĂșme. Eu nĂŁo tenho propriedade da Zefa porque nenhum personagem Ă© de um ator. Hamlet, de Shakespeare, Ă© de todo mundo. Sabe o que acontece quando a pessoa diz 'o personagem era meu'? Falta de contrato. Eu adoraria ter um contrato e estar trabalhando.
P. - Por que vocĂȘ nĂŁo estĂĄ trabalhando?
GG - EstĂĄ difĂcil para todo mundo. A minha vida hoje Ă© mandar meu currĂculo para produtores de elenco, como sempre fiz. Quero fazer novela, filme e minissĂ©rie. Sou Ăłtima atriz, corro atrĂĄs para caramba e faço sucesso com meus personagens porque me dedico. A Zefa, a Alzira de "Mulheres de Areia" e a KĂĄtia de "Por Amor" sĂŁo provas disso.
"Pantanal" foi a sua primeira novela e vocĂȘ virou logo musa. Foi uma das musas dos anos 1990...(Interrompendo) Eu sou musa. Continuo sendo. Eu vivo de arte e vivo de inspiração e inspiro outras pessoas. Eu me aproprio de ser musa e nĂŁo da personagem Zefa. Eu sei o quanto amor, criatividade, experiĂȘncia, fantasia, erotismo, loucura e ignorĂąncia entreguei para a Zefa.
P. - O que lembra dos bastidores de "Pantanal"?
GG - Era tudo maravilhoso. Muito oxigĂȘnio, cĂ©u, lua, o rio e estar no barco com Almir Sater e SĂ©rgio Reis tocando os violĂ”es e cantarolando enquanto pescavam. O SĂ©rgio pegava a minha mĂŁo para eu colocar na cabeça do jacarĂ© e eu quase tinha um troço de tanto medo.
P. - VocĂȘ jĂĄ voltou ao Pantanal?
GG - Recentemente. Ganhei uma viagem da Fundação de Turismo do Mato Grosso do Sul. Uma viagem dos sonhos e eu revi tantas coisas, reconheci vĂĄrios lugares. Foram 15 dias incrĂveis e alegres que me fizeram lembrar o quanto todo mundo era feliz durante as gravaçÔes. Todo mundo com contrato!!! Isso faz a diferença para qualquer ator.
P. - Em um ambiente competitivo como o da TV, vocĂȘ tem alguma mĂĄgoa de algum colega de trabalho?
GG - Sou brasileira (risos). Ponto. Falar sobre isso Ă© dar ibope para quem nĂŁo merece. Eu sou muito elegante para falar mal do outro.
P. - Como Ă© morar no Vidigal?
GGB - Eu nĂŁo sou nascida e crescida aqui como eu vejo as pessoas batendo no peito. AliĂĄs, eu nĂŁo sou de nenhum lugar. Nasci em Salvador e vivo agora no Rio, mas morei em SĂŁo Paulo por muitos anos, Nova York, Buenos Aires, Madri e BĂșzios. Tenho pensado em morar agora em Bonito porque eu nĂŁo tenho essa coisa de apego a um canto. Mas, Ă© difĂcil morar em comunidade. Sinto medo, claro. Vontade de chorar e bate aquele sentimento de impotĂȘncia. AliĂĄs, morar no Rio estĂĄ podre.
P. - Em que sentido?
GG - Todos. Segurança, sujeira, saĂșde, comportamento das pessoas. Eu nasci em 1964 e achava que as coisas iriam evoluir e o que aconteceu? Um total retrocesso. A Ășnica coisa que me dĂĄ orgulho no momento Ă© Anitta. Uma menina de HonĂłrio Gurgel e conquistou o mundo. AtĂ© ela pulou fora agora. Ă mĂŁe enterrando filha, vĂtima de bala perdida, madrasta envenenando enteados, pessoas morrendo sem socorro mĂ©dico, valores invertidos....Loucura total. Sem falar na polĂtica.
Falando em polĂtica...
(Interrompendo) Eu nĂŁo discuto sobre polĂtica. Eu dialogo. NĂŁo entro nessa polarização entre Lula e Bolsonaro. Estou na terceira via e no momento pensando em votar na Simone Tebet (candidata do MDB, Movimento DemocrĂĄtico Brasileiro). O Lula me decepcionou e o Bolsonaro nĂŁo dĂĄ para nem comentar. Me desculpe a classe artĂstica, mas o Sergio Moro nĂŁo cometeu nenhum crime a nĂŁo ser colocar um criminoso na cadeia. SĂł lamento o rumo que o Brasil tomou nos Ășltimos cinco anos e olha a direita que nĂłs tivemos que entubar.
P. - VocĂȘ chegou a sofrer a assĂ©dio ao longo de sua carreira?
GG - Quem nunca? Mas, a pior coisa para mim foi o fato de não poder ser uma humorista porque eu era considerada 'bonita'. Também não podia ter outro personagem de papel que não explorasse a 'sensualidade' que me rotulavam. Uma vez, um diretor disse que um determinado papel não seria para mim porque precisava de uma atriz 'bagaceira'. Ele usou esse termo e eu não esqueci. Sabe quem foi escalada? A filha dele.
P. - Notei que vocĂȘ fugiu das perguntas sobre remake de "Pantanal". Por quĂȘ?
GG - Eu nĂŁo recebo nada da Globo para falar da novela. NĂŁo sou comentarista paga para analisar a obra. O que eu tenho Ă© um compromisso amoroso com a minha experiĂȘncia. Uma experiĂȘncia que perdura e ela foi maravilhosa. Tenho alegria de falar da Zefa.