Carnaval resgata africanidade brasileira e deixa recado: existiremos no futuro!
- Opa!Algo deu errado.Tente novamente mais tarde.
- Diversidade
Ă preciso repetir: o 1° Carnaval pĂłs pandemia mostrou para o mundo e para o prĂłprio Brasil que florescemos de raĂzes africanas. âO mais macumbeiro de todosâ, definiu Nailah Neves, cientista polĂtica e doutoranda pela Universidade de BrasĂlia.
O grande evento retornou este ano de forma ainda mais significativa. Ele Ă© uma resposta de cura para esses meses de pandemia da Covid-19, onde, confinados, vĂamos o aumento da desigualdade social, racial, de classe e gĂȘnero.
Negros e indĂgenas sĂŁo quem mais sentiram a corda apertar. Essa conclusĂŁo Ă© do inĂcio da pandemia, lĂĄ em 2020, quando houve um intenso sobrecarregamento do Sistema Ănico de SaĂșde (SUS). A população negra representava 80% dos pacientes atendidos pelo Sistema, e que jĂĄ tem dificuldades de acesso ao atendimento de qualidade.
Se tem um aprendizado que podemos tirar desse perĂodo Ă©âŠ. nenhum. Como disse o escritor, filĂłsofo e lĂder indĂgena Ailton Krenak: âMentalidade branca de que o sofrimento ensinaâ. O que nosso povo quer direitos garantidos, comida para enfeitar a mesma e existir no futuro!
Terreiros, escolas de samba, memĂłria e territĂłrio
A historiadora, poeta e ativista Beatriz Nascimento havia dado a letra: as escolas de samba sĂŁo quilombos contemporĂąneos, e âquem fez o enredo das escolas de samba este ano foram os orixĂĄsâ. Esta Ășltima foi do cantor Carlinhos Brown, pĂłs desfile pela Mocidade Independente de Padre Miguel.
A Grande Rio trouxe ExĂș, ParaĂso do Tuiuti trouxe OxalĂĄ e NanĂŁ para contar a criação do mundo pela Ăłtica dos yorubĂĄs. Vila Isabel homenageou OmolĂș. " Se o Brasil e o mundo nĂŁo sabiam, agora sabe que cada escola de samba tem origem num terreiro, que cada categoria nada mais Ă© que categorias ressignificadas das estruturas dos terreirosâ, completou Nailah.
âO samba Ă© a janela do mundoâ, reflete VinĂcius Natal. Para o doutor em Antropologia, o samba Ă© um complexo de saberes que tĂȘm na roda a sua origem e permanĂȘncia de uma herança ancestral africana, ressignificada em afrobrasilidade. âFloresce e tece em redes. NĂł que une os mundos. Canção que embala os corpos. Contradição que se revela Brasilâ, escreve no blog Pensamento Social do Samba.
Natal ainda conceitua que, entre diferentes olhares do Brasil, podemos perceber que um enredo narra na avenida, mas tambĂ©m nos faz enxergar um Brasil que escreveu sua histĂłria com sangue indĂgena e negro.
Sim, Ă© bonito ver os desfiles, figurinos, fantasias e carros alegĂłricos, mas Ă© tambĂ©m necessĂĄrio enxergar os e as trabalhadoras por trĂĄs desse grande acontecimento. âComo essas pessoas trabalham? Com que segurança? Recebem em dia? SĂŁo respeitadas?â, indaga o antropĂłlogo.
Mais Carnaval 2022
Clima de romance: famosos beijam muito em noite na MarquĂȘs da SapucaĂ
Saiba quem sĂŁo os herdeiros que comandam as escolas de samba do Rio
Brilhos, strass e transparĂȘncias: os looks dos famosos no Carnaval
"SĂłsia" de Juma e batom azul: Famosos curtem primeira noite de Carnaval no Rio
Madrinha da Unidos da Ponte teve fantasia destruĂda por cachorra com prejuĂzo de R$ 4,5 mil
Ă preciso valorizar sambistas negros e nĂŁo reduzir nossa histĂłria
O desfile passou, o Carnaval 2022 segue em momento de apuração, e a história trilha seu caminho. A avenida vai continuar sendo um espaço importante para discutirmos negritude e ancestralidade, mas o debate precisa avançar para aquilo que é palpåvel e transformador.
Ă urgente abrir portas e olhar para o restante do Brasil. Ă preciso valorizar sambistas, homenageĂĄ-los enquanto vivem, e guardar a memĂłria daqueles que partiram. âO solo sagrado da MarquĂȘs de SapucaĂ se torna um palco onde diferentes visĂ”es, compreensĂ”es, anĂĄlises e ideias de paĂs se apresentam em um espetĂĄculo ritual festivo-competitivo quase centenĂĄrioâ, disse Mauro Cordeiro em seu Twitter.
O professor, que pesquisa o samba, compartilhou pontos interessantes sobre os desfiles. âNĂŁo adianta a produção de narrativa afrocentrada em um desfile, se na prĂĄtica quem constrĂłi esse discurso sĂŁo homens brancos que relativizam a desigualdade racial e nĂŁo vivem a escola no seu dia a dia. Valorizem os sambistas negros de quadras e barracĂ”esâ, pontuou.
As escolas em 2022 deixam um recado: existiremos, nĂłs, povos negros, no futuro! A mudança vem de uma construção coletiva, que tem no passado referĂȘncia e, no futuro, esperança. O samba, as escolas, as ruas e o Carnaval sĂŁo uma resposta para os Ășltimos tempos assombrosos.
AS NARRATIVAS EM DESFILE E A QUESTĂO RACIAL NAS ESCOLAS DE SAMBA, ALGUMAS CONSIDERAĂĂES đ§¶
đžMarco Antonio Teixeira - RIOTUR pic.twitter.com/uvh9KYSMEvâ Mauro Cordeiro (@maurocordeirojr) April 26, 2022